Perturbação do Espectro de Autismo
1. Introdução
Informações
relativas a síndrome do autismo revelam que as primeiras referências
científicas relativas a este problema devem-se ao pedopsiquiatra americano Leo
Kanner (nascido na Áustria) e ao pediatra austríaco Hans Asperger, que, respectivamente
em 1943 e 1944, descreveram uma doença infantil caracterizada, essencialmente,
por uma perturbação na interacção social. Kanner, que trabalhava e publicava as
suas investigações nos Estados Unidos, viu o seu trabalho ser reconhecido nas
décadas de 50 e de 60. A Hans Asperger, que trabalhava em Viena e publicava em
língua alemã, só lhe foi reconhecido o devido mérito no final da década de 80.
Após os
trabalhos destes dois pediatras, foi possível identificar, retrospectivamente, em
muitas obras literárias, descrições de pessoas que viveram há centenas de anos
atrás e que, de acordo com as novas terminologias, preenchem os critérios de
inclusão para o diagnóstico de Autismo.
Deste
modo, o presente trabalho pretende desenvolver aspectos relacionados com a
síndrome do autismo onde veremos alguns domínios e a metodologia usada para a
realização do mesmo optou-se por fazer uma pesquisa bibliográfica com
objectivos de recolher informações para o seu desenvolvimento.
1.1. Objectivos do trabalho
Geral
-
Conhecer
as características da síndrome do autismo nas pessoas afectadas.
Específicos
-
Descrever
os domínios e suas características;
-
Explicar
as manifestações da síndrome do autismo nas pessoas afectadas.
2. Síndrome de Autismo
As perturbações do espectro do autismo constituem uma
síndroma e, por essa razão, os indivíduos com perturbações do espectro do
autismo podem evidenciar uma sintomatologia diversificada, associada a um
diagnóstico de deficiência mental que pode ser moderada ou severa, daí
apresentarem capacidades e funcionamentos distintos, pelo que se torna
imperioso a realização de um diagnóstico diferenciado.
“O autismo é uma perturbação do desenvolvimento que afecta
múltiplos aspectos da forma como a criança vê o mundo e aprende a partir das
suas próprias experiências” (SIEGEL, 2008:21).
O autismo é um atraso de desenvolvimento complexo que surge
durante os primeiros três anos de vida e que interfere com o desenvolvimento
normal do raciocínio, nas interacções sociais e nas capacidades de comunicação
(PÉREZ, GONZÁLEZ, COMÍ e NIETO, 2007). Caracteriza-se por uma limitação
generalizada em várias áreas, uma das quais implica níveis distintos de
limitações qualitativas nas interacções sociais. Independentemente do nível de
funcionamento cognitivo ou da idade cronológica, e à excepção de uma pequena
minoria de crianças com autismo, esses défices ao nível da conduta social
manifestam-se precocemente no desenvolvimento e permanecem como uma limitação
ao longo da vida (Mcgovern & Sigman, 2005, citados por CUNNINGHAM, 2012).
Faz parte de um grupo de perturbações colectivamente designadas por
Perturbações Globais do Desenvolvimento.
3. Domínios e suas Características
3.1. Domínio Afectivo
A tese Kanner de que crianças com autismo sofreriam de uma
inabilidade anata de se relacionarem emocionalmente com outras pessoas foi
retomada por Hobson em 1993. A teoria afectiva sugere que o autismo se origina
de uma disfunção primária do sistema afectivo, qual seja, uma inabilidade inata
básica para interagir emocionalmente com os outros, o que levaria a uma falha
no reconhecimento de estados mentais e a um prejuízo na habilidade para
abstrair e simbolizar (Borges, 2000, Bosa &Callias, 2000; Lippi, 2005
citado por SANTOS & SOUSA, s/d).
3.2. Socialização
As relações sociais. Kanner (citado por FOLGADO,
2013) refere que constituem a característica mais marcante da síndrome autista,
na medida em que é manifesta a incapacidade destas crianças para se
relacionarem com pessoas e situações. Kanner destaca a extrema solidão que
afecta estas crianças.
Características gerais neste domínio
(a) Acentuado défice no uso de múltiplos comportamentos
não-verbais, tais como contacto ocular, expressão facial, postura corporal e
gestos reguladores de interacção social;
(b) incapacidade para desenvolver relações com os
companheiros, adequadas ao nível do desenvolvimento;
(c) ausência da tendência espontânea para partilhar com os
outros prazeres, interesses ou objectivos (por exemplo, não mostrar, trazer ou
indicar objectos de interesse);
(d) falta de reciprocidade social ou emocional.
(e) incapacidade de usar de forma adequada o contacto
ocular, as expressões faciais, a postura corporal e os gestos reguladores de
interacção social;
(f) incapacidade para desenvolver (de forma adequada à idade
mental e apesar de amplas oportunidades) relações com os pares que envolvam a
partilha de interesses, de actividades e de emoções;
(g) raramente procura ou recorre a outras pessoas para
receber conforto e afecto em momentos de tensão ou de angústia e/ou para
oferecer conforto e afecto a outros, quando se mostram angustiados ou tristes;
(h) ausência de partilha de prazer, em termos de satisfação
pela felicidade de outras pessoas e/ou procura espontânea de partilhar o seu próprio
prazer através do envolvimento com outros;
(i) falta de reciprocidade social e emocional, revelada por
uma deficiente resposta ou por resposta desviante às emoções de outras pessoas;
e/ou ausência de modulação do comportamento em resposta ao contexto social e/ou
fraca integração de comportamentos sociais, emocionais e de comunicação.
3.3. Comunicação
Para as crianças com perturbações do espectro do autismo, o
uso da linguagem com finalidade de comunicar está gravemente afectado. Grande
parte destas crianças não desenvolve funções comunicativas, o que resulta em
interacções sociais comunicativas limitadas.
A comunicação e a linguagem. Kanner assinalou um
conjunto de deficiências e alterações ao nível da comunicação e da linguagem
das crianças autistas, destacando algumas características como o uso de uma
linguagem pouco relevante e metafórica ecolalia, a inversão do pronome pessoal
e a falta de atenção dada à linguagem.
Características gerais neste domínio
(a) Atraso, ou ausência total, de desenvolvimento da
linguagem oral (não acompanhada de tentativas para compensar através de modos
de alternativos de comunicação, tal como gestos ou mímica);
(b) nos sujeitos com um discurso adequado, uma acentuada
incapacidade na competência para iniciar ou manter uma conversação com os
outros;
(c) uso estereotipado e repetitivo da linguagem ou linguagem
idiossincrática;
(d) ausência de jogo realista espontâneo, variado, ou de
jogo social imitativo adequado ao nível de desenvolvimento;
(e) atraso, ou total ausência, de linguagem oral, não
acompanhado por tentativas para compensar através do recurso a gestos ou a
mímica, como formas alternativas de comunicação (frequentemente precedidos por
ausência de balbucios com intenção de comunicar);
(f) incapacidade relativa para iniciar ou manter uma
conversação (independentemente dos níveis de competência linguística do
sujeito), não se verificando reciprocidade nem reacção à comunicação por parte
de outras pessoas;
(h) uso estereotipado e repetitivo da linguagem e/ou uso idiossincrático
de palavras ou de expressões;
(i) volume de voz, entoação, velocidade, ritmo e acentuação
anormais;
(j) ausência de jogo realista variado e espontâneo, ou
quando o sujeito é muito novo de jogo social imitativo.
3.4. Autonomia
A qualidade de vida da criança autista pressupõe um direito
inalienável a que todo o ser humano deve ter direito, possibilitando-lhe a
capacidade de viver a sua vida da forma mais autónoma possível, o que implica a
capacidade de eleger e tomar as suas próprias decisões (Gómez, 2008 citado por
FOLGADO, 2013).
De acordo com Luckasson et
al (2002, citada por Lamoureux-Hébert e Morin, 2009), os apoios
individualizados apropriados podem melhorar o funcionamento e reduzir a
incapacidade dos indivíduos.
Também Thompson et al
(2004, citado por Lamoureux-Hébert et
al., 2009) advertem que os apoios necessários dependem do número e da
complexidade das actividades em que os sujeitos estão envolvidos e dos padrões
de vida, da saúde física e mental e do nível de desenvolvimento intelectual.
A incapacidade deve ser vista como o resultado da interacção
do indivíduo com o meio onde se encontra inserido devendo este oferecer
condições de aproveitamento dentro das limitações funcionais da pessoa, através
de meios de que necessita (Santos & Morato, 2007 citado por FOLGADO, 2013).
Segundo Folgado (2013) nesta perspectiva plural de encarar o
sujeito com necessidades educativas especiais, persiste a existência de
articulação entre as reais necessidades do indivíduo e a prestação de apoios
adequados para que seja capaz de melhorar as suas capacidades funcionais.
Verifica-se, por isso, a necessidade de equipas multidisciplinares na avaliação
e na determinação das áreas das suas necessidades realizadas através de
avaliações neurológicas, psiquiátricas, sociais e educacionais, através de
procedimentos de medição do funcionamento intelectual e das competências
adaptativas, nomeadamente, a nível social (Fonseca, 1995, citado por Santos e
Morato, 2002).
Nesta perspectiva, consideramos pertinente reflectir sobre o
comportamento adaptativo na criança autista, ou seja, o conjunto de habilidades
conceptuais, sociais, e práticas adquiridas pela pessoa para corresponder às
exigências da vida quotidiana, uma vez que as limitações nestas habilidades
podem prejudicar o indivíduo na sua relação com o ambiente e dificultar a
interacção e a integração social. Sendo o comportamento adaptativo definido
como o conjunto de habilidades conceptuais, sociais e práticas adquiridas pela
pessoa para corresponder às exigências da vida quotidiana, as limitações nestas
habilidades podem prejudicar o indivíduo na sua relação com o ambiente e
dificultar a interacção e a integração social (Mundy et al., 2007).
3.5. Motricidade
No que concerne ao desenvolvimento da psicomotricidade, Candeias
(1993) defende que as crianças autistas apresentam alterações tónicas posturais
e psicomotoras, referindo que denotam a falta de atitude antecipadora perante a
aproximação materna, patente no facto de não estenderem os braços para a mãe.
Por outro lado não parece ocorrer ajustamento corporal bebé-mãe, sendo notória
a sua hipotonia quando se lhes pega ao colo. Este facto parece denotas a
presença de um atraso considerável no que concerne ao desenvolvimento cognitivo
do sujeito
3.6. Domínio Sensorial
Nas crianças autistas, também ao nível dos aspectos
sensoriais se verifica um certo paralelismo entre as manifestações da
Perturbação Autista e da Síndrome de Asperger, pelo que serão descritas de
forma indeterminada (SOUSA & SANTOS, s/d).
Aarons e Gittens (1992) defendem que a percepção e o
reconhecimento do estímulo visual constitui uma das áreas de capacidade nas
crianças autistas, constatando-se a sua frequente habilidade em fazer coincidir
formas e na elaboração de puzzles.
Outro aspecto importante é a sua aparente hipersensibilidade
ou hiposensibilidade a tipos de estímulos específicos, podendo exprimir-se através
de comportamentos agressivos (DUNLAP, PIERCE & KAY, 1999). É, ainda
apontada a aparente “(…) preferência das pessoas com autismo para os receptores
proximais, tacto, olfacto, etc.” (PEREIRA, 1996:78), dependendo mais da
actividade perceptiva que da análise perceptiva.
De forma resumida (SOUSA & SANTOS, s/d) dizem que os
autistas apresentam determinadas manifestações que levam a considerar a existência
de perturbações a nível da percepção, algo que parece imprimir alterações
significativas no mundo sensorial destes indivíduos.
3.7. Domínio Cognitivo
No aspecto cognitivo, uma dificuldade com que se deparam as
crianças autistas mais aptas é a sua inabilidade para generalizar. Aarons e
Gittens (1992) referem que elas até podem saber o que fazer e como agir numa
determinada situação, contudo são incapazes de usar essa experiência e de a
adaptar quando uma nova situação surge. Essa capacidade de generalizar
estender-se-á a toas as áreas da vida diária, em níveis de dificuldades
acentuadas. À medida que as crianças autistas vão crescendo, torna-se possível
ensinar-lhe estratégia de coping para
situações novas; contudo “(…) elas permanecerão vulneráveis por ser impossível
ensinar capacidades adaptativas para todas as alterações e variações que são
parte da vida diária.” (AARONS & GITTENS, 1992:38).
Quanto à formação de conceitos, Aarons e Gittens (1992)
apontam o facto das crianças autistas aprenderem na ausência de compreensão,
para que o conhecimento que aparentemente possuem não possa ser utilizado e
generalizado, tal como se esperaria numa criança normal.
Entretanto, as crianças autistas, de um modo geral, possuem
perturbações de índole cognitiva. A maioria denota défices no âmbito da
aprendizagem, da formação de conceitos e da imaginação. Por outro lado, o nível
de inteligência parece não evoluir com a idade, enquadrando-se frequentemente
nos casos de atrasos severos ou ligeiros (PEREIRA, 1996), enquanto
concomitantemente apresentam uma rigidez peculiar de pensamento e
comportamento, acompanhada de uma pobreza imaginativa (FRITH, 1996; JORDAN
& POWELL, 1995).
4. Conclusão
Compreendeu-se neste trabalho que o autismo é uma das mais
graves perturbações do desenvolvimento que pode afectar o ser humano. No
entanto, proporcionar às crianças com autismo oportunidades de conviver com
outras da mesma faixa etária faculta o estímulo às suas capacidades
interactivas, coibindo o isolamento contínuo. Pensamos nós que, possibilidade
de interacção com pares é a base para o seu desenvolvimento, assim como para o
de qualquer outra criança. Desse modo, acredita-se que a convivência
compartilhada da criança com autismo na escola, a partir da sua inclusão no
ensino comum, possa favorecer os contactos sociais e proporcionar não só o seu
desenvolvimento, mas o das outras crianças, na medida em que estas últimas
convivam e aprendam com as diferenças.
5. Referência Bibliográfica
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autismo: a guide for parents and professionals. London: Routledge.
CANDEIAS, M. (1993). Autismo: sinais precoces. Fórum
Sociológico, 3, 25-31.
CUNNINGHAM, A. (2012). Measuring Change in Social
Interaction Skills of Young Children with Autism. Journal of Autism and
Developmental Disorders, 42, 593-605.
FRITH, U.
(1996). Autism: Explaining the enigma. Oxford, UK: Blackwell.
FOLGADO, S. B. (2013). A Comunicação e a Interacção na
Criança Autista: Um Estudo de Caso. Dissertação apresentada à Escola Superior
de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco para cumprimento dos
requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Educação Especial –
Domínio Cognitivo e Motor.
JORDAN, R.
(1995). Understading and teachinh«g children with autism. Chichester: John
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LAMOUREUX-HÉBERT,
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PÉREZ, J., GONZÁLEZ, P., COMÍ, M. & NIETO, C. (2007).
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SIEGEL, B. (2008). O mundo da criança com autismo:
Compreender e tratar perturbações do espectro do autismo. Porto: Porto Editora.
SOUSA, P. M. L.; & SANTOS, I. M. S. C. (s/d). Caracterização
da síndrome autista.pdf
SOUSA, P. M. L.; & SANTOS, I. M. S. C. (s/d). Como
intervir na perturbação autista.pdf
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