História de Moçambique: Moçambique no auge do colonialismo, 1938-1944
História de
Moçambique: Moçambique no auge do colonialismo, 1938-1944
A Reestruturação da
Sociedade Moçambicana, 1938-1944
1.1 Características
gerais do período 1938-1944
Uma característica desse período é que havia procura
renovada de matéria-prima. Assim, em 1938, o estado português começou a
desenvolver métodos novos e mais eficazes para o aumento da produção de algodão
nas colónias. Se bem que a produção em Moçambique tivesse aumentado, entre 1931
e 1937, isso representava apenas cerca de 20% das necessidades da indústria
têxtil portuguesa.
Uma das matérias-primas que era buscada era o algodão e com
a crescente procura mundial, o preço do algodão no mercado internacional
aumentou. Foi nesta altura que a indústria têxtil portuguesa recebeu um grande estímulo
para o seu desenvolvimento através do acesso ao mercado têxtil em Espanha,
cujas fábricas diminuíram a produção durante a prolongada guerra civil que
atingiu esse país europeu (1936-1939).
Pressionado pelos proprietários da indústria têxtil, o governo
de Salazar alterou o antigo sistema de prémios financeiros e criou instrumentos
administrativos capazes de fomentar, directa e mais eficazmente, a cultura e
comercialização do algodão. O seu objectivo era garantir a auto-suficiência em
algodão, a preços baixíssimos, dentro do chamado “Império Português”.
O governo português, através de legislação para o efeito,
passou a poder controlar, a partir de Lisboa, todos os aspectos da produção e
comercialização do algodão nas colónias. Lembremos que Moçambique era uma das
suas colónias. Deste modo, criou-se, em 1938, a Junta de Exportação de Algodão
Colonial em que a sua sede estava localizada em Lisboa. Através deste
organismo, o governo pretendeu estabelecer um maior controlo sobre as
companhias concessionárias em Moçambique. O sistema de produção camponesa
mantinha-se, e as companhias obrigaram-se a desenvolver, mais activamente, a
cultura do algodão em concessões alargadas. Toda a exportação tinha de ser
aprovada pela JEAC, caso não, perderia as suas concessões.
Para além da crescente procura do algodão, a II Guerra
Mundial, que durou de Setembro de 1939 até Setembro de 1945, e que envolveu
todos os países industrializados, provocou graves perturbações no comércio
mundial de matérias-primas. Esse fenómeno afectou muito a economia moçambicana,
e o país era o maior fornecedor desses recursos. Desenvolveu-se uma guerra
marítima de grande envergadura, em que cada beligerante procurou estabelecer o
controlo exclusivo sobre as rotas do comércio, assegurando dessa forma, o
fornecimento de matérias-primas para garantir o aumento da sua produção
industrial bélica. Por outro lado, cada um dos blocos em conflito pretendia
impedir, ao seu oponente, o acesso às fontes dessas matérias-primas, como forma
de enfraquecer a respectiva indústria.
As enormes perdas de recursos provocadas pela guerra (por
exemplo, navios carregados afundados) e a produção industrial elevada tiveram
como resultado a elevação dos preços das matérias-primas. A Grã-Bretanha, em
especial, pagava altos preços pelas suas importações de produtos alimentares.
A deslocação do comércio marítimo e dos mercados mundiais
reforçou a estratégia da burguesia portuguesa em se abastecer com diversas
dificuldades de matérias-primas das suas próprias colónias, incluindo o
algodão. Além disso, Portugal, aproveitando a crescente procura internacional
de matérias-primas, foi grande fornecedor de produtos das suas colónias aos
blocos beligerantes.
Portugal utilizou a sua neutralidade de modo bastante
lucrativo e em benefício da sua própria acumulação. Os dirigentes colonialistas
portugueses apresentaram a guerra como um “flagelo necessário”, a suportar por
todas as partes da Nação. Era a 'economia de guerra', de 1939 a 1945, que se
podia resumir no seguinte:
i. Um processo de acumulação maciço de capital, centralizado,
pelos mecanismos do estado corporativo, na grande burguesia industrial e bancária
portuguesa com as suas ramificações coloniais;
ii. um processo de acumulação assente na sobre exploração
dos trabalhadores e no saque colonial. A não participação na Guerra e a posição
ambígua face aos blocos em conflito, irá permitir o reforço da posição de
Portugal a nível do comércio externo, com base no aproveitamento das
matérias-primas de Moçambique e das outras colónias.
1.2 Capital português
e, reorganização da administração colonial
A história diz que as circunstâncias da guerra facilitaram
também a crescente substituição do capital não português em Moçambique por
capital português que, após dez anos da política económica de Salazar, já tinha
atingido um certo nível de acumulação. No fim da década de 30, a burguesia
portuguesa procurou colocação segura, garantida pelo estado, para os seus
capitais e investimentos.
O exemplo mais evidente deste processo foi a transformação
da Société Colonial Luso-Luxembourgeoise, antiga concessionária de algodão no
norte de Moçambique. Depois da ocupação do Luxemburgo pela Alemanha, o ministro
português das colónias julgou conveniente encorajar capitalistas portugueses a
pagar 50 milhões de escudos aos antigos proprietários pela sua parte na companhia
(Baptista, 1962). Em 1942, esta sociedade foi absorvida pela Companhia dos
Algodões de Moçambique que, recém-constituída com capitais portugueses e
detendo o monopólio da produção algodoeira de Nampula e de vastas regiões de
Cabo Delgado, Niassa e Zambézia, se tornou, de longe, na maior companhia de
algodão em Moçambique.
Em 1943, o governo português legislou sobre a actividade de
capitais estrangeiras em Portugal e nas suas colónias. Foi então promulgada a
Lei de Nacionalização de Capitais, a qual explicitava que a exploração de
serviços públicos, actividades em regime exclusivo ou quaisquer outras de
interesse fundamental para a defesa do estado ou para a economia, só seria
permitida a empresas portuguesas. A lei especificava que empresas portuguesas
eram todas aquelas em que pelo menos 60% do capital fosse pertença de
portugueses.
Em 1940, chegou a Moçambique um novo Governador-Geral: José
Tristão de Bettencourt. Homem da máxima confiança nos círculos dirigentes
portugueses, Bettencourt teve o papel de dinamizar o aparelho de Estado
colonial no sentido de coordenar, de uma maneira mais rigorosa do que
anteriormente, a produção nas zonas rurais de Moçambique, para que a burguesia
portuguesa aproveitasse plenamente as circunstâncias da Guerra.
2. As culturas
forçadas
2.1 Mercado de
Nametil, Nampula.
Os baixos preços e vigarices praticados nos mercados de
algodão provocaram a constante resistência dos produtores. De facto, a partir
de 1938, o cultivo do algodão, nas concessões reorganizadas, iniciou uma longa
luta entre os produtores camponeses por um lado, e as companhias e
administradores por outro, que decorreu numa primeira fase até 1942, e durante
a qual foram elaborados, passo a passo, os mecanismos de um sistema de cultura
forçada.
2.2. Generalização da
cultura obrigatória
Em reacção à crescente resistência à cultura do algodão em
vastas áreas, as Companhias e o Estado colonial começaram a desenvolver os seus
métodos para forçar o cultivo, quaisquer que fossem as condições dos solos. Os
meios de intimidação utilizados incluíam os sipaios, agentes da administração
colonial, cuja função era geralmente acompanhar os recrutadores de mão-de-obra
forçada. Do ponto de vista da burguesia portuguesa, a expansão do uso de tais
métodos violentos de compulsão obtiveram o efeito desejado.
Em 1941, a produção do algodão excedeu a de 1939, o primeiro
ano da propaganda generalizada. Então, em 1942, os jornais de Lisboa
orgulhavam-se ao anunciar que a produção do algodão colonial passara a cobrir
mais de 90% das necessidades portuguesas, comparada com os 40% dos dois anos
anteriores, sendo a maior parte produção moçambicana.
2.3 O cultivo forçado
de arroz
Para além do reforço da política já estabelecida para a
cultura de algodão, as circunstâncias da II Guerra Mundial exigiram uma nova
política para a cultura de arroz. Na década 1929-1939, a produção e
comercialização de arroz em Moçambique diminuiu, tornando-se mais barato
importar arroz a granel do sudeste asiático (via Singapura). Esta importação
atingiu cerca de 11,000 toneladas em 1939 (Rego, 1942).
No entanto, a redução significativa da navegação comercial e
o desenrolar dos acontecimentos políticos no sudeste asiático, nomeadamente a
expansão do Japão e a queda de Singapura em seu favor, provocaram a interrupção
no fornecimento do arroz. Em resposta a esta última situação, e para promover a
auto-suficiência em arroz, o governo colonial decidiu introduzir a produção
obrigatória do arroz.
Os concessionários deviam distribuir as sementes,
fertilizantes e sacos, tendo cada homem que cultivar um hectare e cada mulher
meio-hectare. O arroz devia ser vendido pelo camponês apenas ao concessionário,
a um preço baixo, fixado pelo governo. O concessionário processava e revendia o
produto, enriquecendo-se, dessa forma, em todo o processo de comercialização.
Paisagem da cultura
da Chá, Gurúè, Zambézia
Tendo a II Guerra Mundial despertado a procura de todas
estas matérias-primas, os proprietários das plantações começaram, simultaneamente,
a dinamizar a produção, necessitando, por isso, de urgentes e maiores
fornecimentos de mão-de-obra.
Essa procura foi acentuada pela política de culturas
obrigatórias: a produção forçada do algodão e do arroz levou a que muitos
homens, nas zonas em que a venda de tais produtos era suficiente para pagar o
imposto, deixassem de ter interesse em serem trabalhadores sazonais nas
plantações. Na verdade, em áreas de solos apropriados e havendo boas condições
climatéricas, o cultivo de algodão podia ser mais lucrativo do que o trabalho
na plantação.
Actuação do governo
colonial face à crise de mão-de-obra
Em reposta às crescentes queixas dos proprietários das
plantações, que desejavam apropriar-se dos lucros rápidos que se podiam obter
com os preços praticados durante a guerra, o Governador-Geral visitou as
províncias do Norte para apreciar a extensão da crise. Na Zambézia, província
mais afectada, o governo reuniu pela primeira vez os dados populacionais de
cada administração. Para toda a província, o total de homens disponíveis era
adicionado de mais 40 mil homens, número suficiente para resolver a crise de
mão-de-obra nas plantações. Com tais informações, Bettencourt optou por uma
solução administrativa para obstar a falta de 'incentivo' para o trabalho nas
plantações.
Reforço dos
auxiliares administrativos: régulos e sipaios
Uma outra política, dinamizada por Bettencourt, na
reorganização da força de trabalho rural, dizia respeito aos poderes dos
régulos. Uma cláusula da circular 818/D7 deu aos régulos, quando fossem
encarregados nesse sentido pelos administradores e chefes de posto, o papel de
reunir aqueles que não tivessem cumprido integralmente as suas obrigações, a
fim de serem distribuídos pelas empresas que precisavam de mão-de-obra.
Contudo, segundo Bettencourt, a divisão dos chefados
tradicionais tinha sido demasiado grande, nos decénios que se seguiram a
conquista colonial, e o poder da maioria dos chefes ficara reduzido a tal
ponto, que eles eram mais símbolos de decadência do que de autoridade.
Em 1944, o regime colonial completou uma reorganização
profunda de toda a política referente aos 'auxiliares' da administração civil,
nomeadamente os sipaios, intérpretes e régulos. O regulamento promulgado
detalhava exaustivamente os deveres dos régulos, chefes de grupos de povoações
e chefes de povoações, preconizando o seu papel fundamental como
"executores" da "intervenção superior portuguesa".
Desta reorganização, nos anos seguintes, tiravam alguns
régulos proventos consideráveis, como: percentagem do imposto de capitação,
prestações de serviços dos camponeses nas suas próprias machambas de algo dão e
outras culturas, multas aos infractores das leis coloniais e tradicionais,
pagamento de tributos em dinheiro, aquando de cerimónias e ritos, etc.
4. A estrutura de
produção e as suas consequências
4.1 Crescente
exploração do campesinato
A crescente taxa de exploração, que exigia a manutenção e
até a intensificação da pressão administrativa, pode-se avaliar através do
custo de vida. Nas zonas rurais, a medida habitual disto era o preço de tecidos
de algodão, o produto transformado mais procurado. Informações da Zambézia e de
outras zonas do Norte mostram que, no período da Guerra, o preço dos panos
subiu 300% em relação ao valor que tinham antes da Guerra, descendo
substancialmente na sua qualidade e duração.
De facto, a indústria portuguesa, agora sem concorrência dos
Indianos e Ingleses, vendia produtos de qualidade inferior nas suas colónias.
Um inspector colonial chegou mesmo a aconselhar a população, através dos
régulos, a poupar o seu pouco dinheiro na esperança da chegada de melhores
tecidos, depois da guerra.
Da mesma forma, a maioria dos contratados continuou a
receber o salário mínimo estabelecido em 1930. Se uma minoria de trabalhadores
das fábricas recebia 2$50 escudos por dia, sem alimentação, esta remuneração
representava uma diminuição considerável, se se considerar a inflação dos preços,
especialmente dos tecidos. O custo da alimentação também aumentou, rapidamente,
durante a Guerra. O custo fixado para alimentação, nas plantações do norte, em
1930, foi de 50 centavos. Em 1944, 1 escudo já não era suficiente: a
alimentação fornecida aos soldados custava 2$70 por dia, o que explicava o
facto de não faltarem homens a oferecerem-se para o recrutamento militar, onde
o trabalho, em tempo de paz, não se comparava, em dispêndio de energia, com o
do trabalhador rural, que passava 9 horas de enxada na mão.
No Sul do Save, onde o nível de salários e impostos era mais
alto, agravou-se também a inflação de custos. O próprio Governador propôs um
aumento de 25% dos salários, para evitar manifestações de descontentamento (Rego,
op.cit., 1944, p.395. 26. Ibid., p.362.126).
A elevação de preços, incluindo o dos géneros alimentícios,
colocou o camponês de todo o país numa situação muito difícil. Com efeito, um
hectare de amendoim rendia, normalmente, 700 escudos e com menos trabalho que
um hectare de algodão, que dava, na melhor das hipóteses, apenas 200 escudos.
No entanto, ainda em 1944, o Governo-Geral diminuiu, ainda mais, o preço de
compra do algodão. Pode dizer-se que a força policial e o clima de tensão
foram, cada vez mais, necessários nas zonas rurais para induzir o camponês a
produzir algodão, quando estava mais interessado em produzir outras culturas.
Em Chemba, nesse mesmo ano, um agricultor, com a ajuda das
suas 12 mulheres e 24 filhos, produziu 250 sacos de algodão e 1.070 sacos de
mapira. Com a venda de 500 sacos de mapira, a 50 escudos cada um, realizou
25.000 escudos, para além do valor do algodão. Em Matire, distrito de Buzi, 3
agricultores de arroz conseguiram, apesar das cheias que assolaram a zona,
vendas no valor de 6.600, 7.200 e 13.200 escudos. Quase todos os agricultores
destas zonas pediram, às autoridades, ajuda na aquisição de equipamento, como
charruas de disco e tractores para obviar as perdas em bois abatidos pela
tripanosomiase, e camiões para assegurar o transporte conveniente.
Desejavam aumentar os seus rendimentos, através de produção
mais intensiva e da sua participação na rede de transportes e comércio rural,
que rendiam maiores lucros, mas eram normalmente monopolizados pelas empresas
coloniais (incluindo comerciantes asiáticos).
No sul, apesar do aumento do número de agricultores negros
com charruas e bois, a subida dos preços atraiu novos machambeiros brancos aos
melhores solos, originando, por conseguinte, a expulsão dos negros.
Nesta região, também, os interesses dos criadores de gado
negros entraram, cada vez mais, em choque com os dos criadores brancos e as
necessidades da capital colonial. Na altura do cancelamento das importações de
carne da África do Sul no início da II Guerra Mundial, em vez de aumentarem a
quantidade de cabeças proveniente de criadores negros para abate no matadouro
municipal ao preço de compra estabelecido para os criadores brancos, promoveram
várias campanhas para venda compulsiva de gado. A venda fazia-se em feiras
especiais, nas quais eram oferecidos preços geralmente baixos aos criadores
negros.
Isto originou uma forte resistência destes criadores porque,
além do preço baixo, surgiram dúvidas sobre o destino do gado vendido.
Suspeitava-se que era, em parte, acrescido às manadas dos brancos, o que foi
confirmado pelo Chefe dos Serviços Agrícolas, em 1944 (Grilo, 1946). Como
resultado destas aquisições, no mesmo ano, a Cooperativa de Criadores de Gado,
que representava os criadores brancos, fornecia já um número considerável de
cabeças de gado para abate. Esta organização, numa tentativa de aumentar os
seus lucros, começou a pressionar as autoridades para reduzirem a compra, para
abate, aos criadores negros.
No período da Guerra aumentou, consideravelmente, o número
de moçambicanos que trabalhavam temporária ou permanentemente nos territórios
vizinhos.
Segundo as estatísticas oficiais, o número de trabalhadores
moçambicanos, na África do Sul, passou de 105.286, no começo de 1940, para
137.676, no fim de 1944. Na Rodésia do Sul, no mesmo período, de 68.304 passou
para 93.977.
Neste país, a partir de 1940, o número de trabalhadores
moçambicanos ultrapassou o número proveniente dos fornecedores tradicionais,
nomeadamente, Niassalândia e Rodésia do Norte.
Este aumento explica-se pela conjunção de dois factores. A
crescente actividade produtiva destes países, que aumentaram, rapidamente, o
fornecimento de matérias-primas a Grã-Bretanha e construíram novas indústrias
locais, capazes de substituir importações daquele país, provocou uma grande
procura de mão-de-obra. Moçambique, país já constituído como reserva de
mão-de-obra, estava em condições de responder, prontamente, a essa procura,
porque as más condições de vida, causadas, particularmente, pelas culturas
forçadas e pela elevada taxa de exploração absoluta, estimularam a saída de
muitos trabalhadores, atraídos pelos melhores salários oferecidos, nesse tempo
de expansão económica.
Verificam-se, porém, ligeiras alterações no destino que
levavam os migrantes moçambicanos. Por exemplo, deu-se uma redução do número de
migrantes para as minas do Rand, onde os salários estavam fixados em 3 libras
(300 escudos), enquanto aumentava o número dos que iam para as plantações de
açúcar do Natal, onde se pagava 4 libras (Legassick & Clerq, 1978).
5. A resistência ao
colonialismo
A crescente exploração colonial provocou, novamente, uma
forte e contínua resistência do povo moçambicano, particularmente, contra as
culturas forçadas, que afectaram simultaneamente vastas áreas do país de norte
a sul.
5.1 A resistência
generalizada às culturas forçadas
Os camponeses, submetidos a uma intensa exploração, reagiram
das mais variadas formas: são numerosos os exemplos dessa resistência, que se
verificou em tão diversas regiões de Moçambique.
Em 1939 a 1940, os administradores de áreas próximas das
fronteiras com a África do Sul e Suazilândia assinalaram que algumas famílias
preferiam incendiar as suas próprias palhotas e atravessar a fronteira a
cultivar o algodão. Igualmente, em Cabo Delgado, recomeçou a emigração de
famílias para o Tanganhica, logo após a introdução da cultura forçada do
algodão. O mesmo aconteceu em áreas mais distante da fronteira, como Manjacaze,
em Gaza.
No fim da campanha agrícola de 1940, em Mulevala, ao norte
da Zambézia, alguns camponeses preferiram queimar as suas colheitas a receber
as somas baixíssimas, que os seus vizinhos tinham recebido, o correspondente a
uma média de 11 escudos por cultivador.
5.2 O movimento
associativo
A II Guerra Mundial foi, para toda a África, de uma
importância decisiva. Os africanos das colónias não-portuguesas foram
largamente utilizados, dentro e fora da África, integrados nos exércitos
coloniais. O chamado 'esforço da guerra' tinha levado, ainda, à intensificação
da produção e da exploração do trabalho, nos vários países colonizados. Disto
resultou a morte de milhares de africanos nos teatros de guerra (estima-se que
só a África oriental terá perdido cerca de 50 mil homens).
Nas então colónias portuguesas, o impacto das transformações
também se fez sentir, salvaguardadas algumas diferenças. Se nas outras partes
de África, incluindo a África do Sul e a Rodésia do Sul, os partidos e os
sindicatos se apresentaram como os núcleos nacionalistas mais activos, em
Moçambique e nas outras colónias portuguesas esse papel ficou circunscrito as
associações. De facto, o atraso do desenvolvimento económico, a acção
controladora e repressiva do colonial-fascismo, e a política deliberada de
'assimilação' não permitiram que as associações se transformassem em
verdadeiros partidos.
A vida e acção destas associações continuavam a processar-se
segundo duas perspectivas. De um lado estavam as autoridades coloniais, que
mantinham o controlo e a vigilância sobre a camada que se agrupava nas
associações e na qual confiavam como agentes da sua política, mas que, ao mesmo
tempo, receavam como potencial oposição anticolonial nacionalista. Do outro lado
estava a comunidade colonizada que encarava as associações, na pessoa das suas
direcções, como intermediários, advogados das suas causas.
Nota:
Este texto foi retirado do livro: História de Moçambique, Vol. 3, Moçambique no auge do colonialismo, 1930 - 1961.
Referências
bibliográficas
Baptista, J. do Amparo. [coord], Moçambique, província
portuguesa de ontem e hoje, Vila Nova de Famalicão, 1962, p.401.
Grilo, F.M. Relatório do Chefe da Repartição Central dos
Serviços Agrícolas, Lourenço Marques: Imprensa Nacional, 1946, partes II/III,
p.288.
Legassick, M. & Clerq, F. Capitalism and migrant labour
in southern Africa: the origins and nature of the system. Universidade de
Londres, Institute of Commonwealth Studies, mimeo, 1978.
Rego, P. Relatório do Governador interino da Província do
Sul do Save, relativo ao ano de 1942, pp,400-402.
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