quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Prolongamento da vida por meio de analgésicos

Considerações iniciais

Hoje trago um tema que pode ser do interesse de muitas pessoas o “Prolongamento da vida por meio de analgésicos”.
Este é um tema da área da bioética, que actualmente está ter muito destaque nos pesquisadores. A literatura indica que prolongar a vida por meio do uso de analgésicos é um processo que na sua essência aumenta o tempo de vida das pessoas que pelo menos já estejam numa idade avançada, evitando assim a sua morte. 
Entretanto, uma coisa dessa não pode ser novidade, uma vez que o mundo todo está cada vez mais a apresentar um vasto desenvolvimento, desde a medicina, tecnologias de informação, entre outras áreas.
Estando cientes de que estamos numa era em que as novidades biotecnológicas prometem aumentar significativamente a longevidade humana, entretanto, embora o processo traga vantagens para a vida humana, há quem diga esse processo vai também modificar as questões ético políticos. Por isso que nesta pequena publicação, trago algumas considerações em relação a este tema, e tenho como referências, as contribuições dFrancis Fukuyama, visto ser um dos autores que mais a mim interessou as suas ideias em relação a presente temática. Não pretendo trazer tudo o que ele diz em relação ao assunto, mas algumas ideias básicas. Importa referir que no quadro teórico deste documento, quando necessário, faço um cruzamento entre o tema em epígrafe com alguns princípios da igreja, ou princípios de Deus.

Prolongamento da vida por meio de analgésicos

Com o desenvolvimento da medicina, principalmente na sua busca de cura e de tratamentos cada vez mais sofisticados, do ponto de vista médico, a morte passou a ser vista como fracasso profissional. Sendo criada a chamada “distanásia”, um processo muito sério de medicalização para prolongar o processo de morte, que pode vir acompanhado de muito sofrimento.

Segundo a Encíclica Evangelium vitae Ioannes Paulus PP. II, o homem encontra-se diante do mistério da morte. (…) Com efeito, quando prevalece a tendência para apreciar a vida só na medida em que proporciona prazer e bem-estar, o sofrimento aparece como um contratempo insuportável, de que é preciso libertar-se a todo o custo.

No entanto, devido aos analgésicos consumidos para prolongar a vida, nota-se que algumas pessoas não estão a conseguir morrer naturalmente, e estudos recentes segundo SOL (s/d) apontam que os maiores prejudicados nesse ponto são os idosos, com doenças crónicas e degenerativas. Talvez o conjunto mais preocupante de consequências derive do acesso desigual aos produtos biotecnológicos destinados a aumentar a longevidade humana, por meio da gestão liberal deste sector de mercado onde, num futuro próximo, poderão ser os indivíduos a fazer as suas próprias opções nos “supermercados genéticos”, equipando os seus corpos na corrida contra o tempo, e exercendo um poder de escolha para o qual as nossas sociedades poderão não estar verdadeiramente preparadas.

Segundo estatísticas da Organização Mundial de Saúde, daqui por apenas um ano, em 2020, e pela primeira vez na História, o número de pessoas com mais de 60 anos será maior do que o número de crianças com idade igual ou inferior a 5 anos. Os mesmos dados estatísticos, divulgados na revista The Lancet, prevêem que em 2050 o mundo terá cerca de 2 biliões de idosos (CHATTERJI, 2015 cit. por SOL, s/d). 

Esta realidade do prolongamento do tempo de vida torna-se ainda mais flagrante se atendermos aos dados disponíveis sobre a evolução da esperança média de vida em países como os Estados Unidos onde, no ano de 1900, era de 48,3 anos para os homens e de 46,3 para as mulheres, tendo passado, no ano 2000, ou seja, cem anos depois, para 74,2 anos nos homens e 79,9 nas mulheres, o que significa que no espaço de um século quase duplicou a longevidade de ambos os sexos, e isto sem a intervenção da biomedicina ou o recurso a dispositivos biotecnológicos para o prolongamento da vida (FUKUYAMA, 2002).

Entretanto, imagine-se o que será da longevidade humana daqui a outros cem anos quando, muito provavelmente, as práticas de prolongamento da vida com recurso às biotecnologias tornarem-se recorrentes, que problemas éticos se colocarão? Como se poderão reorganizar politicamente sociedades compostas maioritariamente por idosos, ou seja, num cenário onde as biotecnologias terão como um dos sectores preferenciais de intervenção a área do prolongamento da vida, que tipo de sociedades teremos?

Numa era em que as novidades biotecnológicas prometem aumentar significativamente a longevidade humana, torna-se fundamental pensar grande nesta questão, muito mais, pensar as consequências ético-políticas que poderão resultar de sociedades crescentemente envelhecidas. Assim, colocam-se não só questões relacionadas com a definição de padrões de qualidade da vida prolongada até ao extremo, como também dificuldades de ordem prática, no âmbito da governação, sustentabilidade e proporcionalidade económica e populacional deste tipo de sociedades.

FUKUYAMA (2002) refere que aquilo que se apresenta no horizonte como sendo uma autêntica revolução biotecnológica terá um impacto significativo em quatro áreas fundamentais: as ciências do cérebro, o controlo farmacológico do comportamento, a engenharia genética e o prolongamento da vida. E neste último âmbito, o autor apresenta-nos um contributo particularmente interessante para a discussão acerca das implicações ético-políticas do prolongamento da vida com recurso aos dispositivos biotecnológicos. Não só isso, como também não devemos esquecer que prolongar a vida é um acto contra os princípios de Deus, pois «…(…) e quer vivamos, quer morramos, pertencemos ao Senhor» (Rm 14, 7-8). 

Por essa razão que vale a pena morrer pelo Senhor, pois, …quem vive o seu sofrimento no Senhor fica mais plenamente configurado com Ele (cf. Fil 3, 10; 1 Ped 2, 21) e intimamente associado à sua obra redentora a favor da Igreja e da humanidade. É esta experiência do Apóstolo Paulo, que toda a pessoa que sofre é chamada a viver: «Alegro-me nos sofrimentos suportados por vossa causa e completo na minha carne o que falta aos sofrimentos de Cristo pelo seu Corpo, que é a Igreja» (Col 1, 24). 

SOL (s/d) cita Francis Fukuyama que na sua obra O Nosso Futuro Pós-Humano: Consequências da Revolução Biotecnológica. Nesta obra, Fukuyama (2002) refere que aquilo que se apresenta no horizonte como sendo uma autêntica revolução biotecnológica terá um impacto significativo em quatro áreas fundamentais: as ciências do cérebro, o controlo farmacológico do comportamento, a engenharia genética e o prolongamento da vida. Segundo SOL (s/d) neste último âmbito, o autor apresenta-nos um contributo particularmente interessante para a discussão acerca das implicações ético político do prolongamento da vida com recurso aos dispositivos biotecnológicos.

Nas palavras do próprio autor (idem, FUKUYAMA, 2002), por mais que muitos especialistas em gerontologia digam que “parar o processo de envelhecimento é altamente improvável”, porque este resulta da junção de toda uma complexidade de outros processos ao nível celular, orgânico e outros e que, por isso, será difícil encontrar um mecanismo singular e simples que o possa travar, a verdade é que também ninguém previa há cerca de um século atrás que a esperança média de vida quase duplicaria, o que deve levar a nós pessoas a acreditar que, efectivamente, “Se existe um atalho genético para a imortalidade, a indústria biotecnológica já deu início à corrida para o encontrar (…).”
(FUKUYAMA, op. cit., p. 103.).

Segundo o mesmo autor, “No actual ponto da situação, não é possível prever se a biotecnologia conseguirá um remédio tão simples para o prolongamento da vida como uma pílula que permita viver mais uma ou duas décadas. Contudo, mesmo que tal nunca aconteça, parece seguro afirmar que os efeitos cumulativos de todas as investigações biomédicas presentemente em curso levarão, ao longo do tempo, a um aumento das expectativas de vida, acentuando assim a tendência que se verificou durante o século passado.”[1].

No entanto, no nosso entender é que fala-se de uma proposta de prolongamento de vida com recursos a meios biotecnológicos, estamos a dizer que estamos no topo do desenvolvimento da bioética e tecnologias, mas não se deve esquecer que o homem é chamado a uma plenitude de vida que se estende muito para além das dimensões da sua existência terrena, porque consiste na participação da própria vida de Deus. 

A sublimidade desta vocação sobrenatural revela a grandeza e o valor precioso da vida humana, inclusive já na sua fase temporal. Com efeito, a vida temporal é condição basilar, momento inicial e parte integrante do processo global e unitário da existência humana: um processo que, para além de toda a expectativa e merecimento, fica iluminado pela promessa e renovado pelo dom da vida divina, que alcançará a sua plena realização na eternidade (cf. 1 Jo 3, 1-2).

Considerações finais

Estamos frente a um tema muito interessante do século XXI – o prolongamento da vida por meio de analgésicos, que é um processo que será efectuado por meio de biotecnologias. No entanto, a literatura consultada permitiu compreender que o envelhecimento poderá ser perspectivado, ou talvez até já o esteja a ser, o que nos colocará inevitavelmente perante dilemas éticos e implicará, obviamente, toda uma reconfiguração das nossas sociedades aos mais diversos níveis. E ao que vimos durante o desenvolvimento do trabalho, o autor Francis Fukuyama parece estar muito preocupado com essas questões. 

E ao que foi possível perceber por meio das contribuições deste grande autor, uma das primeiras consequências éticas expectáveis a partir de toda esta obsessão pelo prolongamento da vida talvez se prenda com a possibilidade, já amplamente explorada e debatida, de algumas investigações, principalmente quando realizadas por empresas não estatais, poderem incorrer em práticas eticamente questionáveis, como o próprio uso de embriões humanos com finalidades de investigação na área do prolongamento da vida.

Na verdade, num cenário onde hipoteticamente todos poderão prolongar quase infinitamente a vida dos seus corpos graças às biotecnologias, uma das questões éticas de maior relevância talvez se prenda com a própria definição de padrões de qualidade da vida quando prolongada até ao extremo, tendo em conta que aumentar a duração do corpo sem uma correlativa preocupação pela qualidade de vida poderá trazer questões particularmente inquietantes. Enfim, uma vez que não pretendemos com este trabalho finalizar o tema, vamos parar por aqui com essas considerações finais, entretanto, que seja óbvio que é uma prática contra os princípios de Deus e trata-se apenas de uma obsessão humana em querer-se viver mais do que o normal.



[1] Ibid., p. 104.
 
Referências bibliográficas

Encíclica Evangelium vitae Ioannes Paulus PP. II. «Só Eu é que dou a vida e dou a morte» (Dt 32, 39): o drama da eutanásia.

FUKUYAMA, Francis. O Nosso Futuro Pós-Humano, Quetzal Editores, Lisboa, 2002, p. 99.

SOL, Ana Isabel Figueiredo. Biotecnologias e prolongamento da vida: Notas para uma reflexão ético-política sobre o envelhecimento, (s/d). [Disponível em: <https://eg.uc.pt/bitstream/10316/44524/1/>]

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