Um breve historial sobre a Acção Social ou Serviço Social em Moçambique
Um breve historial sobre a Acção Social ou Serviço Social em Moçambique
A questão da acção social ou
serviço social em Moçambique é um assunto que é regida por diversas etapas.
Quive (s/d) cita Kassotche
(1998), apontando que a primeira etapa é o período pré-colonial onde refere-se
que a tarefa de assegurar socialmente as pessoas era baseada no princípio de
solidariedade e ajuda mútua enquadrado nas “relações e práticas sociais que,
por via de trocas de bens e serviços, asseguram na sociedade algo do bem-estar
e alguma protecção social”.
Assim, de acordo Faleiros (1991)
citado por Quive
(s/d), diz que estas relações caracterizam-se por ser de familiaridade, de
amizade e vizinhança, em que cada um pode ajudar o outro na esperança de que
amanhã também vai receber ajuda, sem, no entanto, precisar de pagar
monetariamente. Os moçambicanos adoptaram este princípio ao longo da sua vida,
com o propósito de enfrentar as diferentes formas de riscos sociais que
predominam até hoje nas zonas rurais e urbanas, referenciadas a um grupo de
pertença e obedecendo a regras sociais de cada grupo ou comunidade “numa
economia de subsistência”.
Faleiros
(2001), ao abordar o surgimento do serviço social a nível mundial, aponta que o
serviço social era estruturado por organizações religiosas, especialmente da
Igreja Católica Romana e nesse momento, tinha sua prática fundamentada e
inspirada na providência divina, uma vez que “o trabalho social consistia no
reforço da moralidade e da submissão das classes dominadas. Era, portanto, o
controlo social da família operária para adequar e ajustar seu comportamento às
exigências da ordem social estabelecida”.
Voltando
ao contexto moçambicano sobre o surgimento do serviço social, Quive (s/d),
refere que a segunda etapa ocorreu nos finais do século XIX. Com a colonização
introduziram-se novas formas de trabalho, o trabalho assalariado,
particularmente nas zonas urbanas, o que promoveu o êxodo rural, bem como à
dissociação dos indivíduos dos seus grupos de referência, criando-lhes novas
necessidades por passarem a trabalhadores assalariados.
Neste
período colonial, o regime colonial, dada a sua natureza, era constituído por
três classes de cidadãos:
1ª
classe: os colonos que tinham direito ao gozo pleno de cidadania;
2ª
classe: os assimilados que gozavam de alguns direitos e;
3ª
classe: os indígenas que não gozavam de nenhum direito de cidadania.
Ainda
de acordo com Quive (s/d), aponta que com o objectivo de beneficiar os
servidores do regime colonial, foi introduzido em 1901 em Moçambique o
Regulamento da Fazenda do Ultramar, redigido na Metrópole, que garantia a
Previdência Social aos Servidores do Aparelho do Estado Colonial, em detrimento
dos trabalhadores moçambicanos e indígenas. Uma das razões primordiais para a
aplicação deste Regulamento visava a reintegração destes trabalhadores
portugueses no sistema de segurança social português quando regressassem à
Metrópole. Outra razão, é justificada pelo facto destes possuírem condições
económicas e financeiras que lhes possibilitavam as contribuições para a
segurança social.
Aponta-se
segundo Quive (idem) que os trabalhadores indígenas ocupavam posições
subalternas e auferirem salários muito baixos. Além disso, o movimento
associativo nos locais de trabalho era quase inexistente, o que neste período
fragilizou muito a luta dos moçambicanos pelo alargamento dos seus direitos
sociais, incluindo os de segurança social. Assim, apenas alguns trabalhadores
que, na altura, já estavam organizados em pequenos sindicatos, como por
exemplo, os da SOGER, é que já manifestavam a necessidade de serem também
integrados em programas de segurança social.
Assim,
com a independência nacional em 1975, o Regulamento Ultramarino da Fazenda de
1901 foi actualizado através do decreto 52/75 de 8 de Fevereiro, tendo sido
introduzidas alterações de acordo com as novas condições dos funcionários do
aparelho do Estado. Por exemplo, o tempo de serviço reduziu de 40 para 35 anos,
(Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, artigo n.º 430), e passaram a ser
concedidas prestações em caso de acidentes de trabalho, doença, invalidez,
aposentadoria e morte (idem).
De
acordo com Castel-Branco (1995) citado por Quive (s/d), diz que neste período,
a situação da protecção social em Moçambique alterou-se completamente. O
Governo de Moçambique independente, caracterizou-se por uma centralização do
poder político e económico, o que implicava a preocupação de organizar e
controlar a sociedade. Assim, introduziu uma política de ocupação (trabalho)
para todos, através das empresas e machambas estatais, ao mesmo que
subvencionava diversos serviços para a população, como saúde, educação,
habitação etc. O novo Estado em implantação, segundo Castel-Branco “era o
intérprete supremo do modelo ‘Socialista’.
É
fundamental acrescentar que a Constituição da então República Popular de
Moçambique de 1975 já impunha o direito à segurança social quando, no artigo
32º, se refere a protecção de todos os cidadãos em caso de incapacidade e
velhice. A Lei 8/85 de 14 de Dezembro (Lei do Trabalho) retoma a questão,
mostrando necessidade da criação de um sistema de segurança social (Quive,
s/d).
Quive
(s/d), diz que houve uma reformulação das políticas do País, onde começaram a
vigorar os Programas de Reajustamento Estrutural (PRE), o que obrigou o Estado
a reduzir à sua intervenção na economia e a diminuir despesa pública, como
exigência do Banco Mundial (BM) e do Fundo Monetário Internacional (FMI). Kassotche
(1998), afirma que foi no IV Congresso do Partido FRELIMO, em 1983, que ficou
decidida a adesão de Moçambique a estas instituições da Breton Woods.
Estas
instituições lideram um novo contexto sócio-económico e político demarcado por
três tipos de processos de legitimação: i) políticos; ii) económicos e iii)
científicos, marcados pela “expansão do capitalismo e da economia liberal à
escala mundial” (Giddens, 1998 citado por Quive, s/d).
E
foi neste contexto que se criam os serviços de protecção social que coincidem
com a implantação de uma economia do tipo capitalista, e cujo objectivo era
providenciar um sistema de segurança social capaz de dar resposta às
necessidades da sociedade e dos cidadãos na nova realidade.
Neste
período, o governo de Moçambique cria os alicerces para a implantação de um Sistema
de Segurança Social para cobrir também os trabalhadores do sector público e
privado, o qual deve garantir a subsistência material dos trabalhadores em caso
de invalidez, velhice e outras contingências (ibid).
O
autor (idem), refere que é neste mesmo contexto que surge o Decreto
14/87 de 20 de Maio que substitui o de 3/83, e aprova o Estatuto Geral dos
Funcionários do Estado (EGFE). Fixa, no âmbito da sua aplicação, o consagrado
princípio de rigoroso acatamento da legalidade na Administração Estatal, pelos
órgãos do poder popular e pelos funcionários, garantindo que os actos da
administração, que se desenvolvem também na esfera dos direitos do cidadão,
obedeçam a Lei, com vista à eliminação das arbitrariedades e da usurpação e/ou
desvio de poderes. Este estatuto veio a ser actualizadas em 1996, e define o
direito à aposentação para os funcionários do aparelho do Estado (EGFE, MAE,
1996).
Importa ainda referir segundo
Quive (s/d) que logo depois da independência nacional, em 1975, o Governo
moçambicano criou vários programas de assistência social. Mais tarde em 1994, a
partir da Secretaria do Estado para a Acção Social, é criado o Ministério para
a Coordenação da Acção Social (MCAS), o qual, por decreto presidencial n.º
01/2000 de 17 de Janeiro, deu origem ao Ministério da Mulher e da Coordenação
da Acção Social (MMCAS). A partir de 2005, este Ministério foi transformado em
Ministério da Mulher e Acção Social.
De forma mais resumida, o
desenvolvimento da protecção social em Moçambique conheceu várias fases, sendo
de destacar as seguintes:
Período pré-colonial que se estende até 1901;
1901 - Regulamento da Previdência Social;
1914 – Criação do Montepio; Regulamento do Funcionalismo do
Ultramar;
1963 – Fundo da Acção Social para Trabalhadores Rurais
(FAST);
1966 – Surgimento de primeiros sindicatos de trabalhadores;
1967 - Aprovação do Abono de Família);
1975 até 1987 - Adaptação do sistema de protecção social
colonial para à nova realidade de Moçambique independente;
1987 até à actualidade (Aprovação do novo Estatuto dos
Funcionários do Estado
1989 - Criação do INSS;
1994 - Criação do Ministério para a Coordenação da Acção
Social;
2000 – Criação do Ministério da Mulher e Coordenação da Acção
Social;
2005 – Criação do Ministério da Mulher e Acção Social).
O QUE SE ESPERA DE UM ASSISTENTE SOCIAL EM MOÇAMBIQUE? (Uma visão da Universidade Católica de Moçambique)
Segundo a
Universidade Católica de Moçambique (UCM), o Serviço Social em Moçambique visa
formar um assistente humanista, solidário, crítico, íntegro e inovador, capaz de
intervir social e comunitariamente, e de fazer uso de um corpo de competências
técnicas e científicas para a promoção, animação, execução e avaliação de
iniciativas, tendo em vista a promoção do bem-estar individual e social.
1. Dotar as pessoas de uma formação técnica favorecendo
ao educando uma visão holística ajudando a criar hábito de objectividade;
2. Formar técnicos com intuito de resolver os males
sociais;
3. Formar técnicos munidos de princípios inerentes
a profissão como sendo métodos do serviço social, métodos de desenvolvimento
comunitário, métodos de desenvolvimento grupal.
4. Um Assistente Social em moçambique deve adquirir as
competências profissionais:
5. Conhecer a legislação da acção social nacional e
internacional;
6. Conhecer a realidade humana e social da comunidade;
7. Elaborar, executar, monitorar e avaliar projectos na área
social;
8. Identificar as necessidades presentes na sociedade e dar-lhes
uma resposta profissional;
9. Investigar e avaliar problemas de natureza social;
10. Orientar e apoiar as pessoas com necessidades educativas
especiais;
11. Planear, organizar e administrar bens e serviços sociais;
12. Prestar apoio psicológico e moral aos trabalhadores com problemas no local de trabalho;
Prestar assessoria a órgãos da administração pública, empresas privadas e movimentos sociais, em matéria relacionada com as políticas e a garantia de direitos civis, políticos e sociais da colectividade;
Prestar assessoria a órgãos da administração pública, empresas privadas e movimentos sociais, em matéria relacionada com as políticas e a garantia de direitos civis, políticos e sociais da colectividade;
13. Promover um diagnóstico, rápido e participativo, sobre
fenómenos sociais, no âmbito do serviço social;
14. Reflectir de uma maneira crítica sobre a profissão do serviço
social;
15. Saber aconselhar e encaminhar os indivíduos com necessidades
especiais;
16. Saber expressar-se, ler e escrever correctamente em língua
portuguesa;
17. Saber trabalhar com grupos marginalizados ou vulneráveis,
reabilitando-os e inserindo-os na comunidade;
18. Ser ético e íntegro no exercício das suas funções
profissionais;
19. Usar um conjunto de técnicas de intervenção para melhorar a
vida social, pessoal, educativa e cultural da comunidade.
A UCM acrescenta que assim a
formação do pessoal em Serviço Social no nosso País prevê um leque alargado de
opções profissionais, tanto nas entidades públicas e privadas, como nas
organizações sem fins lucrativos, a todos os níveis: local, regional, nacional,
comunitário e internacional, podendo trabalhar:
1. Nas entidades ao serviço das populações com necessidades
especiais (por exemplo, idosos, pessoas/grupos com deficiências físicas ou de
desenvolvimento, seropositivos, pessoas a transitar das instituições
psiquiátricas, prisionais ou unidades de reabilitação, para a comunidade, entre
outras;
2. Nas organizações de defesa dos direitos da mulher, da criança
e do adolescente, do emigrante e das minorias étnicas, das vítimas de violência
ou maus-tratos, e das pessoas que sofrem de doenças crónicas;
3. Nas organizações dedicadas à investigação social e à
formação;
4. Nos conselhos municipais, nas paróquias e noutras organizações
do poder local e regional;
Nos serviços e organizações, nas áreas de segurança social, saúde, ensino, aconselhamento, justiça e reinserção social.
Nos serviços e organizações, nas áreas de segurança social, saúde, ensino, aconselhamento, justiça e reinserção social.
Conclusão
Ficou claro no
desenvolvimento deste trabalho que o serviço social começou com objectivos de
ajudar as pessoas desfavorecidas, uma questão de carisma onde as pessoas devem
estar dispostas a ajudar os outros a melhorarem as condições da sua vida. Assim,
acção social desenvolve-se a partir dos ideias
de humanismo e democracia e os seus valores radicam no respeito pela Igualdade,
valor e dignidade de todos. Desde o seu inicio, há anos atrás, o trabalho
social centra a sua acção na resposta às necessidades das pessoas, bem como o desenvolvimento
das capacidades do ser humano. Os direitos humanos e a justiça social motivam e
legitimam a sua acção. Solidariamente com os mais desfavorecidos visa mitigar a
pobreza e liberar as pessoas vulneráveis e oprimidas promovendo a sua inclusão
social. O assistente social é o indivíduo que já se encontra com capacidades
plenas para desenvolver suas acções em diferentes áreas e suas tarefas são de
ajudar as pessoas na resolução dos seus problemas.
Referências
FALEIROS,
V. P. Saber profissional e poder
institucional. 6 ed. São Paulo: Cortez, 2001.
Quive, S. Sistemas formais
e informais de protecção social desenvolvimento em Moçambique. (s/d).
Comentários