Os Advérbios: Modo, Tempo e Lugar
Introdução
Neste artigo proponho
apresentar um pequeno resumo de alguns aspectos importantes estudados sobre os
advérbios, sua delimitação como classe, sua conceituação e classificação.
Através de leituras de outras pesquisas mais especializadas sobre o tema, foi-me
possível perceber que havia muito o que se pesquisar sobre o assunto e, logo
quis partilhar ou pelo menos expandir o que li.
Não pretendemos com este
artigo, esgotar com o assunto, pois não nos seria fácil. Em vista disso,
resolvemos trabalhar, a princípio, com os advérbios de modo, tempo e lugar, considerados
por muitos autores como sendo os verdadeiros advérbios, por apresentarem
propriamente as ideias de modificação verbal (modo) e de circunstância (tempo e
lugar).
Os Advérbios
Como conceito, Advérbio é a
expressão modificadora que por si só denota uma circunstância (de lugar, de
tempo, modo, intensidade, condição, etc.) e desempenha na oração a função de
adjunto adverbial. [...] (BECHARA, 1999, p.287). O advérbio é constituído por
palavra de natureza nominal ou pronominal e se refere geralmente ao verbo, ou
ainda, dentro de um grupo nominal unitário, a um adjectivo e a um advérbio
(como intensificador), ou a uma declaração inteira, (BECHARA, 1999: 287).
Alguns advérbios, chamados
de intensidade, podem também prender-se a adjectivos, ou a outros advérbios,
para indicar-lhes o grau: muito belo
(= belíssimo), vender muito barato (=
baratíssimo), (LIMA, 1990:174).
Portanto, os autores se acreditam
na ideia principal de advérbio como modificador verbal, admitindo ainda seu
funcionamento como modificador de adjectivo, advérbio ou oração. Por outras
palavras, os advérbios são palavras modificadoras do verbo. Servem para
expressar as várias circunstâncias que cercam a significação verbal.
Segundo Mattoso e Camara (1999:
77), diz que na estrutura da língua portuguesa, defende-se que por critérios
semântico, morfológico e sintáctico as palavras estão divididas em nomes, verbos
e pronomes.
O autor acrescenta: “O
advérbio é nome ou pronome que serve de determinante a um verbo”. Em uma das
suas notas, ele esclarece que alguns advérbios dão uma qualificação a mais a um
adjectivo, mas não sendo isso um aspecto geral, que deva entrar na definição da
classe.
Segundo NASCIMENTO (2008) do
ponto de vista semântico, o advérbio funciona como uma espécie de ingrediente ao
significado da acção; já em relação ao aspecto sintáctico implica uma
ocorrência conjunta a um constituinte, ou seja, “estar em construção com”. Entretanto,
Perini defende que nenhuma das duas ideias particulariza a classe, já que ambas
se aplicam a outras classes; além disso, ainda não se aplicam a todos os
elementos do mesmo grupo, já que os advérbios de negação, afirmação e dúvida,
por exemplo, não “modificam” o verbo.
Ainda em relação ao plano sintáctico
sobre a questão de “modificar”, de acordo com os estudos sobre os vocábulos
adverbiais não é possível definir essa estrutura “conjunta” a “um constituinte”
em muitos casos, haja vista a grande mobilidade do termo, que muitas vezes está
relacionado à oração como um todo.
Sobre a ideia de
“circunstância”, também ficam algumas dúvidas (NASCIMENTO, 2008). Em uma das definições
para a palavra no Dicionário Houaiss (2001), encontramos: “1 – Condição de tempo,
lugar ou modo que cerca ou acompanha um facto ou uma situação e que lhes é
essencial à natureza”. No entanto, podemos observar que o conceito por si só é inexacto
para definir a classe, uma vez que nem todo advérbio é circunstancial.
Portanto, entendemos que os
advérbios denominados de afirmação, negação, dúvida, por exemplo, não
expressariam a noção de circunstância. A partir disso, consideraremos aqui como
únicos advérbios com a noção de “circunstância” os de tempo e de lugar.
Advérbios de modo
Na perspectiva de
NASCIMENTO (2008), a maioria dos elementos desse grupo é representada pelas formas
terminadas em -mente. Essa formação é muito frequente no português. À forma
feminina dos adjectivos se prende o sufixo (exceptuando alguns casos, como por
exemplo: cortesmente e burguesmente, que são formados pelo adjectivo masculino),
que na definição da gramática normativa indica fundamentalmente modo, maneira.
Contudo, é importante
destacar que nem todas as formações em –mente são advérbios de modo, como nos
seguintes exemplos:
1 – Provavelmente, a carga tributária continuará se elevando.
2 – É certamente difícil a disputa em concursos públicos.
3 – Mais investimento em
educação é uma iniciativa extremamente
importante.
4 – Crianças em situação de
risco ficam em condições terrivelmente
cruéis.
Dessa forma, além do tipo “modo”,
encontramos os advérbios de dúvida (provavelmente, possivelmente), de
intensidade (excessivamente, demasiadamente), de tempo (imediatamente, diariamente),
de afirmação (certamente, realmente), de ordem (primeiramente, ultimamente) (idem,
NASCIMENTO, 2008).
Entretanto, em muitos
casos, o que realmente acontece é um predomínio do carácter subjectivo no enunciado,
que expressa uma opinião do emissor, não se referindo mais estritamente ao
processo verbal. Nesse caso, o termo actua sobre toda a frase, por isso sua
mobilidade é maior, sendo por vezes relativamente indiferente seu
posicionamento no início ou no final da oração – característica não tão reconhecida
para os advérbios de modo.
Advérbios de tempo
Tem que ficar claro que os elementos
classificados como advérbios de tempo são aqueles que respondem à pergunta: quando? Neste sentido, estão nesse
grupo: cedo, tarde, ontem, hoje, amanhã, antes, depois, sempre, nunca etc. Bomfim (1988) salienta que, excluindo-se ontem, hoje e amanhã, os
demais não respondem a essa pergunta. Por isso que acreditamos que em certa
medida e em determinados contextos respondem sim, mesmo que seja de maneira
mais imprecisa e subjectiva.
Portanto, o par
“cedo/tarde”, por exemplo, tem ligação directa com o processo verbal, como em:
“Ele dorme cedo” ou “A professora chegou tarde”. Entretanto, não especifica uma
posição no tempo determinada, ou seja, não focaliza um momento específico, e por
isso pode conviver com, e até determinar, outra forma temporal precisa. Por exemplo:
5 – O mestre chegou cedo hoje.
6 – O mestre chegou hoje
cedo.
Além da alteração
semântica, a troca de posição implica também mudança do termo determinado: no
exemplo 5, portanto, “cedo” refere-se ao verbo; no 6, ao advérbio “hoje”, considerando
ainda que a faixa temporária específica está sempre no “hoje” (NASCIMENTO,
2008).
No que concerne ao grupo
“ontem/hoje/amanhã”, podemos identificar uma extensão definida de tempo em por
exemplo (24 horas), que pode se referir ao verbo, como também ao enunciado como
um todo.
Porém, NASCIMENTO (2008)
diz que a característica mais notável desses advérbios é seu carácter díptico
(Esses termos têm seus sentidos vinculados aos participantes e à situação de fala).
Assim, em “hoje” o tempo do enunciado coincide com o tempo da sua emissão
(enunciação); “ontem” é o tempo anterior a este, e “amanhã”, o posterior. Além
disso, diferenciam-se do par anterior por não serem passíveis de intensificação
e por poderem desempenhar a função de sujeito, como no exemplo abaixo:
8 – Hoje e amanhã serão
dias de festa.
Por isso, Bomfim (1988) explica que este grupo se aproxima muito mais
da classe de pronomes que da de advérbios. E também o advérbio “agora” apresenta
as mesmas propriedades de “hoje”, com a diferença de estreitar muito mais o espaço
temporal. O que se verifica é que o “agora” é praticamente urgente ou muito
urgente. Enquanto o “hoje” é um pouco longo, e pode ser cumprido em 24h, o que não
se verifica no “hoje” que é imediato, como ilustram os exemplos abaixo:
9 – Agora vou comer o
bolinho.
10 – Hoje terei que fazer
este trabalho.
A dupla “antes/depois” expressa,
além da noção de tempo, a ideia de espaço. Os pontos de referência indicados
pelo par podem relacionar-se tanto a elementos do interior do enunciado quanto
do exterior. Por exemplo:
11 – Antes não havia tanta
violência. (Ponto de referência externo).
12 – Devo estudar à tarde,
depois ajudarei a ti com o seu trabalho. (Ponto de referência interno).
Como é possível observar, esses
elementos referem-se não só ao verbo, mas a toda a oração; podem vir estruturados
com preposição (antes de, depois de); podem aparecer com outros indicadores de
tempo; e são passíveis de intensificação.
Relativamente, aos
elementos “Antigamente/actualmente/futuramente” também não apresentam um ponto de
referência definido; além da questão temporal, também ligam-se à aspectual; referem-se
ao enunciado como um todo; e não são passíveis de intensificação, apesar de não
parecer absurda a construção: “Isso aconteceu muito antigamente”.
Por fim os “Nunca/sempre/frequentemente”,
com maior propriedade até que o grupo anterior, identificam-se mais com a ideia
de aspecto – frequência, hábito, repetição etc. –, que é sempre subjectiva, já
que parte de uma escolha; “nunca” é a marca de ausência de frequência. Podem
incidir sobre o verbo ou sobre toda a oração.
Advérbios de lugar
A ideia geral guardada por
este grupo de advérbios é que seus elementos respondem à pergunta: “onde?”.
Mas, assim como no caso dos temporais, neste conjunto também ocorrem subdivisões,
mais claramente definíveis em dois grupos: aqueles elementos que estão ligados
ao emissor e ao receptor da mensagem (aqui, aí) – os dípticos –; e aqueles que se
relacionam com outro ponto de referência, que pode ser interno ao enunciado ou
não, (op. cit., p. 335).
Os primeiros podem exercer
a função sintáctica de sujeito, além da função adverbial. Por exemplo:
13 – Aqui não é um bom
lugar para conversarmos. (Sujeito)
14 – Estarei aqui amanhã aguardando
sua resposta. (Adjunto adverbial).
Olhe só que o advérbio traz
a preposição implícita, no caso da função adverbial, o que também acontece com
os advérbios de tempo dípticos. Exceptua-se a ocorrência com a preposição “de”:
15 – Depois de ser
atendido, sairei daqui o mais rápido possível.
O segundo grupo dos locativos
pode apresentar uma relação com um ponto de referência mais subjectivo (longe/perto)
ou mais objectivo (abaixo, acima, dentro, fora etc.). Da mesma forma como foi exposto
sobre a questão temporal, Bomfim diz que aqueles, ao contrário destes e dos dípticos,
não respondem satisfatoriamente à pergunta: “onde?”. Também aqui continuamos com
a mesma posição: dependendo do contexto, pode responder. Não levamos em consideração
aqui se a resposta é objectiva e precisa ou não (Ibid, NASCIMENTO, 2008).
Muitos pontos em comum
podem ser observados entre os temporais e os locativos, afinal ambos na verdade
são localizadores: no tempo ou no espaço.
Referências bibliográficas
BECHARA, Evanildo. Moderna
gramática portuguesa. 37. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Lucerna, 1999.
BOMFIM, Eneida. Advérbios.
São Paulo: Ática, 1988.
CAMARA J. R. & MATTOSO,
Joaquim. Dicionário de linguística e gramática. 9.ed. Petrópolis, RJ: Vozes,
1981.
LIMA, Rocha. Gramática
normativa da língua portuguesa. 35.ed. ret. e enriq. Rio de Janeiro: J.
Olympio, 1998.
NASCIMENTO, Solange. Os
verdadeiros advérbios: Modo, Tempo e Lugar. Caderno Seminal Digital, Ano 14, Nº
10, V 10 (Jul/Dez 2008) – ISSN 1806-9142, pp. 322-339.
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