sábado, 6 de julho de 2019

Teoria de Personalidade de Alfred Adler e a Psicologia Individual

Introdução

Para os aspectos relacionados com a personalidade, existem diversos autores que se preocuparam em apresentar suas contribuições sobre essa temática.

Deste modo, o estudo da personalidade tem constituído um domínio interessante na área da psicologia, pois desde os primórdios o conceito de personalidade tem sofrido significativas mudanças, o que nos permite reflectir acerca do quão complexo é esta temática bem como de todas as componentes intimamente relacionadas.

A personalidade e suas possíveis teorias a respeito de seu surgimento tornam-se restringidas e limitadas a determinadas correntes de pensamentos, geralmente são correntes de pensamentos que ora são tradicionalistas ou radicais.

Conforme referimos anteriormente, existem diversos autores que se preocuparam em estudar a personalidade e suas múltiplas facetas, mas neste trabalho o nosso foco serão as contribuições de Alfred Adler sobre a personalidade. Neste âmbito, será feito uma breve abordagem sobre a vida e obra do autor em destaque, veremos mais adiante os aspectos importantes da sua teoria, suas concepções sobre a estrutura da personalidade, os processos da personalidade e como acontece o desenvolvimento da personalidade.

2. Alfred Adler e a Psicologia Individual 

2.1. Breve abordagem sobre a vida e obra


Alfred Adler era filho de um comerciante judeu de classe média, nasceu num subúrbio de Viena no dia 7 de Fevereiro de 1870 e veio a perder a vida em 1937. 
Este autor, quando era criança sofreu um grande número de doenças sérias, incluindo raquitismo, este autor lutou muito para superar sua fraqueza física. 
Ele adorava brincar fora de casa com as outras crianças da vizinhança e era um menino muito popular. Sua posterior ênfase teórica na importância do interesse social e da compensação de inferioridades orgânicas não está desligada de suas experiências precoces.

Adler, aos 18 anos, entrou na Universidade de Viena para estudar Medicina. Estava profundamente interessado no socialismo e compareceu a um certo número de reuniões políticas. Foi numa dessa reuniões que encontrou sua esposa, Raissa Epstein, uma estudante originária da Rússia, que frequentava a Universidade de Viena.

Foi em 1902, tornou-se um dos quatro primeiros membros do círculo íntimo que se desenvolveu em torno de Freud (Fadiman & Frager, 1986). Adler era considerado como um dos membros mais activo do grupo e gozava de uma alta estima por parte de Freud. Nessa altura, seus pontos de vista sobre neurose já tinham começado a diferir das ideias de Freud, de forma significativa, em 1910 este último indicou-o para primeiro presidente da Sociedade Psicanalítica Vienense.
Por volta de 1911, as diferenças teóricas de Alfred Adler tinham-se tornado inaceitáveis para Freud e para muitos outros membros da sociedade em que Adler fazia parte. Por causa dessas divergências de ideias, Adler teve que renunciar à presidência e abandonou a sociedade junto com nove dos outros vinte e três membros (Fadiman & Frager, 1986). De seguida, Adler fundou sua própria organização, a chamada “Associação de Psicologia Individual, que gradualmente se propagou pela Europa.

A sua obra da psicologia individual estuda e investiga o sentimento de inferioridade que determina a «vontade de potência». Esse sentimento, provoca a obtenção de «compensações psíquicas» e o estabelecimento dum «plano de vida», que muitas vezes degeneram nas ficções neuróticas. É uma teoria sobre a personalidade, que incorpora factores tanto sociais, como biológicos. Adler propôs o conceito de interesse social, definido como o potencial inato de cooperar com os indivíduos para atingir metas pessoais e sociais. Sua teoria da personalidade postulou um empenho por auto-estima e tentativa de superar um sentimento de inferioridade.

Adler era um autor que as suas ideias divergiam com as ideias de Freud em alguns pontos de vista sobre neurose e infantossexuais, motivo que o levou a posteriormente romper seus vínculos com uma sociedade, o qual ele presidia. Sua teoria da personalidade postulou um empenho por auto-estima e tentativa de superar um sentimento de inferioridade. Adler publicou muitos escritos e monografias e também começou a dedicar grande parte de seu tempo a excursões para fazer conferências pela Europa e Estados Unidos (idem).

2.2. Aspectos importantes da sua teoria

Segundo Fadiman e Frager (1986) este autor é tido como o fundador do sistema holístico da psicologia individual, que enfatiza uma abordagem, a qual compreende cada pessoa como uma totalidade integrada dentro de um sistema social. 

Alfred Adler na sua teoria sobre a personalidade igualava saúde psicológica à consciência social construtiva. Dessa maneira, ele desenvolveu um sistema de análise psicológica, o qual denominou de psicologia individual, este ainda continua ainda sendo utilizado em clínicas localizadas em diversos países (Fadiman & Frager, 1986).

Segundo Fadiman e Frager (1986), Adler foi enormemente influenciado por algumas correntes teóricas, como as ideias darwinistas em relação ao processo evolutivo humano. Ele observava as pessoas como seres em plena união, apesar de serem entidades biológicas distintas. Adler acreditava que havia um darwinismo social, o qual enfatizava o facto de haver a sobrevivência das pessoas mais fortes e adequadas ao meio social.

Dessa forma, na sua concepção, os indivíduos que não estiverem devidamente adaptados não sobreviveriam no interior da sociedade. Em fim o mundo é dos mais fortes e adaptados, viver na sociedade é um privilégio dos melhores.

O homem individualista para Adler era aquele que estava apto ao lema “conhece-te a ti mesmo” e conheceras o universo e os deuses. No entanto, este não deveria privar-se da colectividade cooperativa, visto que esta é um aspecto muito importante do comportamento social. Somente a partir da cooperação com outros e do perfeito funcionamento cognitivo, podemos superar nossos sentimentos de inferioridade.

Sua principal contribuição para a sociedade mundial foi o estabelecimento de centros de orientação psicológica na área infantil em Viena, os quais serviram como base para a criação de outros centros orientadores em toda parte do mundo.

Na sua teoria da personalidade, o autor postulou existir um empenho por auto-estima e uma tentativa de superar um sentimento de inferioridade que é um dos seus conceitos principais, isto é, o “complexo de inferioridade”, que é um meio da procura compensatória de poder, domínio, superioridade, que seriam alcançados por suas actividades e interesse social no bem comum. Adler é um autor que achava e acreditava que toda criança tem um sentimento de inferioridade por comparação realista com os adultos, maiores e mais hábeis, cuja superação seria sua principal meta na vida.

Adler considerava o individuo como uma pessoa inteira, cuja vida passa da imaturidade para maturidade. Este autor refere que as pessoas decidem o rumo que as suas vidas vai tomar e que independentemente da direcção tomada, procuram alcançar a perfeição dentro do que eles próprios estabelecem. Um aspecto fundamental da teoria de Adler assenta no facto de que o homem deve cumprir 3 tarefas na vida: inserir-se na sociedade, consagrar tempo a um trabalho e desenvolver relações amorosas. Neste âmbito, através destes 3 elementos que uma criança vai desenvolver os seus interesses sociais (Fadiman & Frager, 1986).

Segundo Adler, em cada indivíduo, certos órgãos são de algum modo mais fracos que outros, o que torna a pessoa mais susceptível a doenças e enfermidades envolvendo estes órgãos mais frágeis, ou seja, no nosso entender, este autor agrupou as personalidades humanas tendentes à doença psíquica em três tipos: da acção, tendendo à agressividade e dominação, podendo resultar, por exemplo, em sadismo, dependência química, ou suicídio; da submissão ou dependência, tendentes a desenvolver fobias, obsessões, compulsões, histeria etc.; e da evitação ou fuga, tendentes à psicose (idem).

Adler criou alguns conceitos muito importantes para a psicologia da personalidade, as quais descrevemos a seguir:

Inferioridade e compensação, nesse âmbito, há a inferioridade orgânica, pois, para Adler, cada região do corpo apresenta uma inferioridade básica, inferioridade essa que existe em virtude de herança ou de alguma anomalia do desenvolvimento.

Luta pela Superioridade, a luta pela superioridade para Adler é um elemento do crescimento e desenvolvimento da personalidade, pois conduz a pessoa de um estágio de desenvolvimento a outro superior. Por outras palavras, corresponde ao objectivo superior do homem na sua luta contra os obstáculos: ser agressivo, poderoso superior.

Objectivos de Vida, segundo Adler, cada indivíduo desenvolve um objectivo de vida específico que funciona como centro de realização, influenciado por experiências pessoais, valores, atitudes e personalidade, formando-se no início da infância. Esses objectivos na óptica do autor são formulados a partir da infância quando a criança procura formas de compensação de sentimentos de inferioridade, insegurança e desamparo num mundo adulto. 

Adler salienta que os traços de carácter necessários para atingir o objectivo de vida não são nem inatos nem imutáveis, sendo adoptados como facetas essenciais da direcção do objectivo do indivíduo.

O Estilo de vida, o estilo de vida para Adler corresponde ao princípio do sistema pelo qual a personalidade funciona; é considerado como o todo que comanda as partes. É o princípio que explica a singularidade da pessoa. Cada pessoa tem um estilo de vida e não há dois iguais. O estilo de vida é o único caminho que um indivíduo escolhe para buscar seu objectivo.

O Esquema de Apercepção, esquema de apercepção é a concepção de que cada indivíduo desenvolve de si mesmo e do mundo, dentro de um estilo de vida. O conceito de mundo de uma pessoa é que determina seu comportamento. Entretanto, isto significa dizer que nossos sentidos não percebem factos reais, mas apenas imagens subjectivas deles, como se fosse um reflexo do mundo externo.

O Poder Criador do Self, o Self corresponde a um sistema altamente personalizado e subjectivo que interpreta e tornam significativas as experiências do organismo. Para Adler, o “self” é criador, unitário, consistente e soberano na estrutura da personalidade. 

No nosso entender, a estrutura do self é algo que intervém entre os estímulos que agem sobre a pessoa e as respostas que ela oferece. Nesta perspectiva, o homem constrói  sua personalidade com a matéria-prima da hereditariedade e da sua experiência. Apenas o self criador dá sentido à vida; cria tanto o ideal como os meios de atingi-lo. O self é o princípio activo da vida humana.

Interesse Social, Adler, na sua obra da Psicologia Individual acredita que “todo comportamento humano é social” porque crescemos num meio social e nossas personalidades são socialmente formadas. Interesse social, poderia ser assim entendido como um aspecto de senso de solidariedade, na qual fazem parte os sentimentos de afinidade com o desenvolvimento da comunidade ideal de todo o género humano, o que seria o último estágio da evolução.

Cooperação, a cooperação é considerada por Adler como um método de sobrevivência da raça humana, é também uma das formas mais efectivas de adaptação ao meio ambiente. Adler acreditava que somente através da cooperação com outros, e operando como um membro cooperativo eficaz da sociedade, poderemos superar nossas inferioridades reais ou nosso sentimento de inferioridade.

Outro factor primordial para o desenvolvimento da personalidade observado por Adler é o facto de as crianças que são primogénitas quando deixam de possuir tal característica em virtude de ter nascido outra criança mais nova, tornam-se conservadoras, deixam de lado a pastilha, ficam inseguros.

2.3. Estrutura da personalidade

De acordo com Fadiman e Frager (1986) Adler entende que cada indivíduo, incluindo seus ideais e os meios que visa para alcançá-los, constituem seu “papel de vida”, o qual jaz, em parte, no seu subconsciente. Coerentemente a este papel, o indivíduo subordina suas emoções e desejos específicos. O papel de vida forma-se na primeira infância, sob influência de factores como ordem de nascimento, inferioridade ou superioridade física, e descaso ou super protecção dos pais.

Corpo
Adler diz que o corpo é a maior fonte de sentimentos de inferioridade na criança, que está rodeada por aqueles que são maiores e mais fortes e que fisicamente actuam de forma mais efectiva. Salientava que o mais importante são as nossas atitudes em relação ao nosso corpo (Fadiman & Frager, 1986). 

Referia que muitos homens e mulheres atraentes nunca resolveram sentimentos de feiura e não-aceitação que sentiram na infância, e ainda se comportam como se não tivessem atractivos. Ele era de opinião de que os deficientes físicos podem lutar e melhorar o seu aspecto físico além da média.


Relacionamento Social

Adler dá valor aos relacionamentos sociais como essenciais no desenvolvimento de um estilo de vida construtivo e realizador.

Vontade

Já a vontade é um dos elementos centrais da teoria de Adler, pois para ele, a vontade é um sinónimo de luta pela superioridade e realização de objectivos de vida.

Emoções

Quanto as emoções, Adler apresenta-nos dois tipos: as emoções socialmente disjuntivas, que são aquelas que se referem à consecução de objectivos individuais, e emoções socialmente conjuntivas, aquelas que têm tendência de promover as interacções sociais do individuo.

Assim, fazem parte das emoções disjuntivas, a raiva, medo ou repulsa, que na sua opinião podem ocasionar uma mudança positiva na situação de vida do indivíduo, embora, às vezes, às custas de outros. Esse tipo de emoções na perspectiva do autor resultam de um sentimento de fracasso ou inadequação e servem para mobilizar a força do indivíduo a fim de realizar novos esforços (Adler, 1956 citado por Fadiman & Frager, 1986). 

Em relação as emoções disjuntivas, Adler entende que estas são orientadas socialmente quando a pessoa tem desejo de compartilhar a sua alegria com as demais pessoas.

Intelecto

Quanto a essa questão, Adler afirma que neuróticos, criminosos e outros que fracassaram em actuar na sociedade são bastante inteligentes, pois com frequência dão argumentos e justificativas perfeitas e lógicas para o seu comportamento. Adler denominou esse acto de inteligência por “inteligência pessoal” que vê como uma superioridade pessoal (ibid).

Self

Adler entende que o self é o estilo de vida do indivíduo. É a personalidade considerada como um todo integrado.

2.4. Processos da personalidade

Para Adler, o crescimento da personalidade é principalmente uma questão de mover-se a partir de uma atitude autocentrada e do objectivo de superioridade pessoal para uma atitude de domínio construtivo do meio ambiente e de desenvolvimento socialmente útil. A luta construtiva pela superioridade e o forte interesse social e cooperação são os traços básicos do indivíduo saudável (Fadiman & Frager, 1986).

Em sua teoria da personalidade, Adler menciona que há um princípio dinâmico, este direcciona cada um de nós ao futuro sempre direccionando a uma meta específica. Uma vê, que a meta passa a tornar-se foco geral nosso aparelho psíquico modifica-se rumo à concretização dele. Outro facto é que o mundo real deve agir sobre o mundo das ideias, de modo que as fantasias tornem-se meros objectos acessórios e não principais (op. cit.).

Para ele, as três maiores tarefas que um ser humano defronta-se são o trabalho, amizade e o amor. Todas elas são inerentes a condição da existência humana, não importa de qual pessoa analise e observe. O ambiente social molda a sociedade em si.

2.5. Crescimento e desenvolvimento da personalidade

Para Adler o ambiente social possui considerável importância para o desenvolvimento da personalidade de um individuo. No nosso entender, Adler busca compreender o comportamento humano por seus objectivos e finalidades, mais do que através de suas causalidades. 

Ele acaba por interpretar que o meio social influencia muito mais do que o meio interior, no que condiz ao desenvolvimento ou organização do factor psíquico (Fadiman & Frager, 1986).

Segundo Adler, as crianças superprotegidas não conseguem desenvolver sentimentos sociais; tornam-se déspotas, à espera de que a sociedade se conforme com seus desejos egoístas. 

Adler considerava  esse facto como um dano para à sociedade, mas também, ele acreditava que a rejeição também produz consequências desastrosas nas crianças. Maltratadas na infância, tornam-se adultas inimigas da sociedade. Para o caso dessas crianças maltratadas, seu estilo de vida é dominado pela necessidade de vingança. Significa isto que essas condições de superprotecção e rejeição, produzem mais tarde, na pessoa concepções erróneas sobre o mundo, o que faz resultar num estilo patológico de vida (Fadiman & Frager, 1986).

O ser perfeito é aquele que busca a sua superação, não acreditando que estar inferior aos demais, sendo assim ele adopta o sentimento motivador como a chave de sua vida, dessa maneira ele sobrevive e prospera num mundo onde há uma selecção natural dos seres existentes. Valem lembrar que muitos obstáculos irão bater de frente contra os homens, no entanto o forte derruba todos eles.

3. Conclusão

Neste trabalho foram abordados as contribuições de Alfred Adler sobre a personalidade. Durante a leitura e interpretação do material bibliográfico, foi possível compreender que apesar de existirem vários autores com concepções diferentes, eles se cruzam em alguns pontos. Mas, para todos os efeitos, para caso específico de Adler, compreendemos que a sua teoria apresenta um valor de relevância especificadamente único, visto que a sua abordagem teórica busca fornecer informações relevantes sobre o desenvolvimento da personalidade. 

Vimos que a teoria de Adler é um resultado de ramificações ideológicas surgidas no decurso da árvore dos estudos psicológicos e psicanalíticos. Na verdade, o que importa é compreender taxativamente o conceito de personalidade, visto que esta apresenta traços semelhantes nos escritos dos mais variados autores e estudiosos do ramo da psicanálise. O que varia é o conceito atribuído a origem da mesma, interessando tal estudo a todas as ciências humanas.


4. Referências

Fadiman, J. & Frager, R. (1986). Teorias da Personalidade. Editora: Harbra. Coordenação da tradução Odette de Godoy Pinheiro; tradução de Camila Pedral Sampaio, Sybil Safdié. São Paulo.